segunda-feira, 13 de janeiro de 1997

De ontem para hoje

Dizem os mais velhos que os tempos antigos eram melhores, justificando com várias histórias, algumas tristes outras pitorescas, entretanto, afirmam os novos que tais declarações são frutos do desejo de viver, pois assim pensando supõem voltar ao passado e desse modo, teriam novas oportunidades de continuar vivendo; esta é a origem da saudade e são chamados de saudosistas.
Contavam nossos avós, que em sua época, era comum colocar no umbigo dos recém-nascidos, para secar mais rapidamente, não só terra de formigueiro, mas também picumã que são partículas de carvão que se depositam das fumaças de fogões a lenha e muitas crianças morriam antes mesmo de completar uma semana de vida, pois eram acometidas pelo “mal dos 7 dias”.
Sabemos hoje, que tais mortes eram causadas pelo tétano, proveniente dessa prática imprópria de tratamento.
Ainda contavam que as viagens eram difíceis e tidas como um empreendimento arrojado, sendo freqüentemente antecedidas por uma idéia de separação, somada a uma incerteza sobre o difícil regresso. As despedidas eram longas, cheias de acenos, lenços brancos, adeuses e até mesmo, repletas de lágrimas.
Hoje, devido às melhorias dos meios de transportes, com a fabricação de veículos modernos e de novas técnicas de construção de estradas, são tão comuns que nem sentimos quando alguém parte, pois a certeza da sua volta traz tranqüilidade. De ontem para hoje, muitas coisas mudaram. Muitas outras não!
Revendo certos autores do passado, encontramos relatos atestando que algumas coisas não mudaram, mesmo com a ação do tempo.
Thomas Hobbes - 1646, em seu livro De Cive, comentando as conveniências e incômodos nos diversos sistemas de governo relata: ...Um dos incômodos da autoridade suprema é que o governante pode exigir, além do dinheiro necessário para as despesas públicas... Se ele quiser outro dinheiro mais, em termos de luxo e prazer, com o qual poderá enriquecer filhos, parentes, favoritos e até mesmo aduladores... São mais suportáveis na monarquia do que na democracia, pois, quando o monarca quer enriquecer alguns, os gratificados são poucos, porque o são por um só.
Já numa democracia tantos são os demagogos, ... quantos são os que têm filhos, parentes, amigos e aduladores para gratificar. Todos eles querem não só fazer suas famílias quanto possível opulentas e ilustres, mas também prender com favores as pessoas para melhor se prevenir.
Comparando com a época atual, parece que Thomas Hobbes é comentarista político dos nossos telejornais. Tudo se repete com cristalina clareza e fidelidade.
Na atual democracia, favores e acordos não faltam, artes e habilidades estranhas de governar, são freqüentes, como a figura esdrúxula do Líder do Executivo na Câmara, onde melhor seria Líder do povo que o elegeu e não se tornar o caminho por onde chega a ingerência do Executivo, e ainda, deputados e vereadores que são nomeados Ministros ou Secretários de Estado, num verdadeiro desrespeito aos seus eleitores que os escolheram para legislar, demonstrando um descaso aos políticos ou técnicos, que não mereceram tal consideração, posto que a maior preocupação do Executivo, é criar um ambiente favorável aos seus interesses, pois o suplente que assume já o faz comprometido.
O Padre Vieira, em carta ao Rei D. João IV, de 4 de abril de 1654, diz: SENHOR - No fim da carta de que V.M. me fez mercê me manda V.M. diga meu parecer sobre a conveniência de haver neste estado ou dois capitães-mores ou um só governador.
“Eu, Senhor, razões políticas nunca as soube, e hoje as sei muito menos; mas por obedecer direi toscamente o que me parece.
Digo que menos mal será um ladrão que dois; e que mais dificultoso serão achar dois homens de bem que um... Assim que, Senhor, consciência e mais consciência é o principal e o único talento que se há de buscar nos que vierem governar este Estado.”
Cuidemos nós, que nesta democracia, devemos escolher para nos governar, não apenas um homem de bem para ser o Presidente, como outros que são os Governadores, Prefeitos, Senadores, Deputados e Vereadores. Será que o País possui tantos homens com talento para este mister? Se no tempo de Vieira já era difícil encontrar dois homens de bem, que dirá agora que são tantos?
Quanto à consciência já reclamada, progredimos muito pouco, pois a consciência da maioria dos atuais homens públicos, é de que não têm consciência.
De ontem para hoje, muitas coisas mudaram, pois estamos às portas do ano 2000; somente na política continuamos como antes, ao lado de Thomas Hobbes, enquanto que a grande aspiração da sociedade é ser governada por homens que se realizem no servir e não no ser servido...
Portanto, para o nosso bem estar, bem-vindos sejam tais governantes...